quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Aos que deixei.

Hoje, ao contrário de ontem, o mar se tornou revolto no cair da tarde. Sentei-me na proa e o lampião que dança ao sabor das ondas, me ilumina ao escrever essa carta dentro dessa noite sem estrelas. Como todos os dias, penso nos que deixei nas mais diversas ilhas que pude contemplar.
Hoje, inundado pelo brilho dessa centelha oscilante e com uma saudosa alegria, dedico essa carta aos que deixei e levei pedaços, sejam amores, pedras ou lágrimas.

À vocês, que me acolheram e que, como sempre, fiz do anoitecer minha partida silenciosa.

Não pensem que fui ingrato ao partir na calada da noite, mas as despedidas nunca foram minha forma de partir.Não digo adeus porque , talvez, voltemos a nos encontrar em algum amanhecer noturno.
Não, não fuji ou fujo das ilhas mais belas. Não, não tento mudar o mar que navego, o contemplo. Se hoje, vivo envolto em memórias nesse mar de solidão, foi uma escolha minha. Desculpem-me pela pressa de nossas conversas e aquele gosto de despedida que sempre saíram de minha boca.Preciso navegar...e ,nesse mar, não procuro amores eternos ou pedras precisoas, procuro a mim mesmo. Desculpem-me o egoísmo, mas nasci na solidão e nela me vejo num certo equilibrio melancólico.
Mas não encarem essa melancolia como um defeito ou algo prejudicial.Não sou feliz, mas estou longe de ser alguém triste,apenas vivo onde algumas pessoas evitam ter conhecimento: o mar da própria solidão.
Escolhi navegar pela escuridão recolhendo estrelas por onde passo para iluminar minhas noites sem luas e sem estrelas. Fiz uma escolha,assim como fizeram os que escolheram uma ilha qualquer como descanso eterno e nao me arrependo. Nunca conseguiria viver em terra, logo morreria. Prefiro a eternidade dessas ondas que me levam para o encontro com furacões, mas também me dão crepusculos que nenhum de vocês, aí nas ilhas que deixei, poderiam imaginar tamanha beleza. Repito: fiz uma escolha, preferi navegar sozinho até o último dia, deslizando pelos mares mais coloridos à ter que viver em uma ilha que, em alguns meses, a conheceria por completo e ,depois de conhecê-la , sentar-me-ia nas pedras para ver os barcos viajantes cortando o horizonte sob o mesmos crepúsculos, repetidamente, pelo fim da vida curta que a terra provoca (acredito que quem vive em terra pára no tempo e a tão buscada paz se resume a um dia repetido até o fim.No mar, garanto-lhes que sinto a vida batendo contra o casco da nau todos os dias de uma forma diferente. "ma vie est le mére")
Nunca,peço-lhes, pensem que eu esqueci de vocês, só que eu escolhi o infinito e furioso mar à ter que resumir minha vida à um dia repetindo em circulos.

No mais, agradeço os presentes e sorrisos que me deram, os levarei sempre comigo e, um dia , quando o doce naufrágio fizer de meu nome para "saudade", os devolverei...As ondas os levarão de volta pra vocês.

Eu fiz minha escolha.

Obrigado pela cores do amanhecer e as estrelas das noites

De algum lugar dentro de mim,

Balthazar Sete-Sóis

Um comentário:

lcss disse...

Me entenderias se dissesse que fico feliz ao ler essas palavras? Talvez por sempre saber que tal dia chegaria (ainda que não quisesse), por sempre saber quem você era...
Avante!
Quando você não passar de saudades, saberei onde te encontrar.